Governança da Internet -- Uma Análise no Contexto do Processo da CMSI (2005)

Este texto foi publicado em julho de 2005 pelo Instituto del Tercer Mundo (ITeM): Gobernanza de Internet - Un Análisis en el Contexto de la CMSI, julho de 2005, coleção WSISPapers.Choike.org, Montevideu, Uruguai. Abaixo é reproduzida a introdução ao texto, que está em anexo em português, espanhol e inglês, em PDF.


No recente processo de discussão sobre a governança da Internet, estimulado desde a reunião da Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação (CMSI) realizada em Genebra a partir da criação do Grupo de Trabalho sobre Governança da Internet (GTGI)1, as visões de como deve ser a governança da infra-estrutura lógica da rede das redes2 precisam ficar oscilando entre duas óticas polarizadas: por um lado, os icannianos3 insistem em dizer que, se há algo a ser consertado, assim o será dentro da atual estrutura, que eles gostam de caracterizar como uma estrutura baseada na iniciativa privada. 
No outro extremo, há representantes de alguns países (não necessariamente membros do GTGI) que defendem um repasse de todas as funções da Corporação Internet para Nomes e Números (ICANN) para a União Internacional de Telecomunicações (UIT). Esta última visão polarizada se reforça com o fato de que a UIT patrocinou o GTGI e manteve observadores participando permanentemente com voz ativa tanto no cara a cara quanto nas reuniões que o grupo realizou online, sem falar das intervenções iniciais, bastante explícitas, em defesa dessa ótica nas reuniões do GTGI feitas pelo Secretário Geral da UIT Yoshio Utsumi. 
Entre essas óticas polarizadas se encontra um vasto número de propostas, geralmente voltadas para cobrir muito mais questões que foram identificadas como componentes de um sistema de governança global da Internet no futuro, além de “nomes, números e protocolos” estabelecidos dentro do sistema ICANN. Tais óticas buscam tratar de questões como custos de conexões entre países; cibersegurança e cibercrime (inclusive spam, “phishing” e outras formas de crimes ou ações causadoras de danos sociais através da Internet); patentes, direitos autorais e marcas registradas (no jargão da OMPI4, “direitos da propriedade intelectual” ou DPI); proteção da privacidade e de dados; e muitas outras, conforme descrito na análise do relatório do GTGI. 
O GTGI precisou levar em conta que a infra-estrutura lógica espalhada da Internet tem sérias conseqüências muito além dela mesma, devido a todos os aspectos da sociedade, da política, das economias e da cultura, e as opções precisam ser, portanto, analisadas e consideradas para ver qual lidaria com uma extensa lista dessas sérias conseqüências. 
Por exemplo, em resposta à situação de impressionante degradação a que chegaram os spams e o “phishing”, para não falar da vulnerabilidade da atual tecnologia do Sistema de Nomes de Domínio (DNS), a Força-tarefa para Engenharia da Internet (IETF) é capaz e está se esforçando para construir, digamos, uma “tranca”, que neste caso significaria um sistema seguro de autenticação de envio de email a ser adotado como padrão por todas as operadores de servidores de email do mundo. Por melhor que seja uma tranca, os ladrões sempre conseguem invadir minha casa, então devemos esperar que a tranca venha acompanhada de uma série de outras medidas de proteção à minha comunidade e assim por diante. De forma que a IETF há de compreender que a prescrição de medidas legais, e outras mais, contra perpetradores de crimes relacionados à Internet vai além do seu know-how ou capacidade. 
Por outro lado, é quase impossível uma pessoa dominar know-how suficiente para lidar com todas as questões que possam ter pertinência com a governança da Internet. O GTGI listou mais de 40 dessas questões e, apesar de algumas impressões em contrário, o grupo não se constitui totalmente de especialistas em todas elas. Os membros trouxeram, sim, suas experiências específicas em certos campos afins, bem como sua visão e conhecimento a partir de óticas distintas para tentar montar um relatório útil e, quiçá, sem viés algum, que corresponda ao mandato recebido através do Plano de Ação da CMSI. 
Este documento se propõe a prestar informações sobre os atuais processos de transição na governança da Internet, discutindo algumas das abordagens submetidas a discussão pública, e analisa o relatório final do GTGI. Ele também propicia um breve histórico e informações de referência sobre o atual sistema de governança global especificamente criado para a Internet (aqui mencionado como sistema ICANN). E ainda, faz uma revisão das perspectivas acerca da governança da Internet a partir do ponto de vista de grupos organizados da sociedade civil que estão envolvidos nas discussões correspondentes tanto interna como externamente ao GTGI. 
O texto se baseia em inúmeras contribuições feitas nas reuniões da sociedade civil sobre governança, em informações acumuladas durante o trabalho do GTGI e em diversos artigos escritos por especialistas em um ou mais campos relacionados com o tema principal. Trata-se de uma quantidade de contribuições grande demais para uma listagem neste espaço e nenhuma das quais é responsável pelas opiniões aqui emitidas.