Carlos A. Afonso -- 01-outubro-2004
Quaisquer que sejam os interesses em jogo (e são muitos), está dada a largada efetiva para uma reestruturação da governança mundial da Internet.
Há dois fortes estimulos para que esse processo se acelere. Por um lado, aproxima-se a data (30 de setembro de 2006) em que o Departamento de Comércio decretará a "alforria" da Corporação Internet para Nomes e Números Designados (CINND/ICANN). Por outro lado, aprofunda-se o processo de discussões (tanto no âmbito da ONU como das entidades civis) para construção de uma alternativa que deverá ser debatida na próxima Cúpula Mundial da Sociedade da Informação (CMSI/WSIS), na Tunísia 16-18 de novembro de 2005).
Várias correntes (entre as quais o governo brasileiro) lutam para que, de um lado, se estenda o conceito de governança para além da administração e supervisão de nomes de domínio, números IP e protocolos de comunicação, e de outro se formalize um organismo mundial que seja efetivamente representativo dos vários grupos de interesse.
A União Internacional das Telecomunicações (UIT/ITU) está fora de cogitação para a tarefa. Historicamente, esse organismo da ONU dedicado a coordenar mundialmente os acordos e regras da infraestrutura de telecomunicações é controlado exclusivamente por governos e grandes empresas do setor. Deverá apenas participar da estrutura de governança em um nicho específico. Não há outro organismo da ONU que se aproxime da missão atualmente exercida pela ICANN e entidades associadas - e muito menos um organismo que abra espaço para a desejada participação igualitária.
O grande desafio, portanto, é construir esse novo organismo mundial, garantindo a representação legítima e o mais igualitária possível de todos os grupos de interesse, e assegurando que a transição se dê garantindo a estabilidade, eficácia e segurança do sistema. A rede não pode parar enquanto aguarda a "fumaça branca" da comunidade mundial sobre uma nova estrutura.
Temas fundamentais para o futuro da Internet estão em discussão. Isso inclui o entendimento das fronteiras entre o que é patrimônio da comunidade e o que é privatizável (essa discussão envolve domínios, números IP, padrões e protocolos de comunicação etc), bem como formas de gestão (modelo hierárquico atual, ou um modelo em rede, ampliando a autonomia dos países em relação ao organismo gestor central), e ainda as decisõees sobre as possíveis funções adicionais da governança (segurança, uso adequado, liberdade de expressão, entre muitos outros).
As discussões acontecem em vários foros da sociedade civil (os "caucuses" ou “cauci” regionais e temáticos). Ocorrem também no âmbito da ONU, com a constituição, a partir de outubro, do Grupo de Trabalho de Governança da Internet (GTGI/WGIG) e discussões promovidas pela Força-Tarefa de TICs das Nações Unidas (FTTICNU/UNICTTF).